Ilda e Ramon - Sussurros de Liberdade

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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Declaração da Assembleia dos Movimentos Sociais

"FSM Dacar, Senegal, 10 de fevereiro de 2011

Nós, reunidos na Assembleia de Movimentos Sociais, realizada em Dacar durante o Fórum Social Mundial 2001, afirmamos o aporte fundamental da África e de seus povos na construção da civilização humana. Juntos, os povos de todos os continentes enfrentamos lutas onde nos opomos com grande energia à dominação do capital, que se oculta detrás da promessa de progresso econômico do capitalismo e da aparente estabilidade política. A descolonização dos povos oprimidos é um grande desafio para os movimentos sociais do mundo inteiro.

Afirmamos nosso apoio e solidariedade ativa aos povos da Tunísia, do Egito e do mundo árabe que se levantam hoje para reivindicar uma real democracia e construir poder popular. Com suas lutas, eles apontam o caminho a outro mundo, livre da opressão e da exploração.

Reafirmamos enfaticamente nosso apoio aos povos da Costa do Marfim, da África e de todo o mundo em sua luta por uma democracia soberana e participativa. Defendemos o direito à auto-determinação de todos os povos.

No processo do FSM, a Assembleia de Movimentos Sociais é o espaço onde nos reunimos desde nossa diversidade para juntos construir agendas e lutas comuns contra o capitalismo, o patriarcado, o racismo e todo tipo de discriminação.

Em Dakar celebramos os 10 anos do primeiro FSM, realizado em 2001 em Porto Alegre, Brasil. Neste período temos construído uma história e um trabalho comum que permitiu alguns avanços, particularmente na América Latina onde conseguimos frear alianças neoliberais e concretizar alternativas para um desenvolvimento socialmente justo e respeituoso com a Mãe Terra.

Nestes 10 anos, vimos também a eclosão de uma crise sistêmica, expressa na crise alimentar, ambiental, financeira e econômica, que resultou no aumento das migrações e deslocamentos forçados, da exploração, do endividamento, das desigualdades sociais.

Denunciamos o desafio dos agentes do sistema (bancos, transnacionais, conglomerados midiáticos, instituições internacionais etc.) que, em busca do lucro máximo, mantêm com diversas caras sua política intervencionista através de guerras, ocupações militares, supostas missões de ajuda humanitária, criação de bases militares, assalto dos recursos naturais, a exploração dos povos, a manipulação ideológica. Denunciamos também a cooptação que estes agentes exercem através de financiamentos de setores sociais de seu interesse e suas práticas assistencialistas que geram dependência.

O capitalismo destroi a vida cotidiana das pessoas. Porém, a cada dia,nascem múltiplas lutas pela justiça social, para eliminar os efeitos deixados pelo colonialismo e para que todos e todas tenhamos uma qualidade de vida digna. Afirmamos que os povos não devemos seguir pagando por esta crise sistêmica e que não há saída para a crise dentro do sistema capitalista!

Reafirmando a necessidade de construir uma estratégia comum de luta contra o capitalistmo, nós, movimentos sociais:

Lutamos contra as transnacionaisporque sustentam o sistema capitalista, privatizam a vida, os serviços públicos, e os bens comuns, como a água, o ar, a terra, as sementes, e os recursos minerais. As transnacionais promovem as guerras através da contratação de empresas militares privadas e mercenários, e da produção de armamentos, reproduzem práticas extrativistas insustentáveis para a vida, tomam de assalto nossas terras e desenvolvem alimentos transgênicos que tiram dos povos o direito à alimentação e eliminam a biodiversidade.

Exigimos a soberania dos povos na definição de nosso modo de vida. Exigimos políticas que protejam as produções locais que dignifiquem as práticas no campo e conservem os valores ancestrais da vida. Denunciamos os tratados neoliberais de livre comércio e exigimos a livre circulação de seres humanos.

Seguimos nos mobilizando pelo cancelamento incondicional da dívida pública de todos os países do Sul. Denunciamos igualmente, nos países do Norte, a utilização da dívida pública para impor aos povos políticas injustas e antissociais.

Mobizemo-nos massivamente durante as reuniões do G8 e do G20 para dizer não às políticas que nos tratam como mercadorias.

Lutamos pela justiça climática e pela soberania alimentar. O aquecimento global é resultado do sistema capitalista de produção, distribuição e consumo. As transnacionais, as instituições financeiras internacionais e governos a seu serviço não querem reduzir suas emissões de gases de efeito estufa. Denunciamos o “capitalismo verde” e rechaçamos as falsas soluções à crise climática como os agrocombustíveis, os transgênicos e os mecanismos de mercado de carbono, como o REDD, que iludem as populações empobrecidas com o “progresso”, enquanto privatizam e mercantilizam os bosques e territórios onde viveram milhares de anos.

Defendemos a soberania alimentar e o acordo alcançado na Cúpula dos Povos Contra as Mudanças Climáticas e pelos Direitos da Mãe Terra, realizada em Cochabamba, onde verdadeiras alternativas à crise climática foram construídas com movimentos e organizações sociais e populares de todo o mundo.

Mobilizemos todas e todos, especialmente o continente africano, durante a COP-17 em Durban, África do Sul, e a Rio+20, em 2012, para reafirmar os direitos dos povos e da Mãe Terra e frear o ilegítimo acordo de Cancún.

Defendemos a agricultora camponesa que é uma solução real à crise alimentar e climática e significa também acesso à terra para quem nela vive e trabalha. Por isso chamamos a uma grande mobilização para frear a concentração de terras e apoiar as lutas camponesas locais.

Lutamos para banir a violência contra a mulherque é exercida com regularidade nos territórios ocupados militarmente, porém também contra a violência que sofrem as mulheres quando são criminalizadas por participar ativamente das lutas sociais. Lutamos contra a violência doméstica e sexual que é exercida sobre elas quando são consideradas como objetos ou mercadorias, quando a soberania sobre seus corpos e sua espiritualidade não é reconhecida. Lutamos contra o tráfico de mulheres e crianças.

Defendemos a diversidade sexual, o direito à autodeterminação do gênero, e lutamos contra a homofobia e a violência sexista.

Mobilizemo-nos, todos e todas, unidos, em todas as partes do mundo para banir a violência contra a mulher.

Lutamos pela paz e contra a guerra, o colonialismo, as ocupações e a militarização de nossos territórios. As potências imperialistas utilizam as bases militares para fomentar conflitos, controlar e saquear os recursos naturais, e promover iniciativas antidemocráticas como fizerem com o golpe de Estado em Honduras e com a ocupação militar em Haiti. Promovem guerras e conflitos como fazem no Afeganistão, Iraque, República Democrática do Congo e em vários outros países.

Intensifiquemos a luta contra a repressão dos povos e a criminalização do protesto e fortaleçamos ferramentas de solidariedade entre os povos como o movimento global de boicote, desinvestimentos e sanções contra Israel. Nossa luta se dirige também contra a Otan e pela eliminação de todas as armas nucleares.

Cada uma destas lutas implica uma batalha de idéias, na que não poderemos avançar sem democratizar a comunicação. Afirmamos que é possível construir uma integração de outro tipo, a partir do povo e para os povos, com a participação fundamental dos jovens, mulheres, camponeses e povos originários.

A assembléia dos movimentos sociais convoca as forças e atores populares de todos os países a desenvolver duas ações de mobilização, coordenadas a nível mundial,para contribuir à emancipação e autodeterminação de nossos povos e para reforçar a luta contra o capitalismo.

Inspirados nas lutas do povo da Tunísia e do Egito, chamamos a que o 20 de março seja um dia mundial de solidariedade com o levante do povo árabe e africano que em suas conquistas contribuem às lutas de todos os povos: a resistência do povo palestino e saharauí, as mobilizações européias, asiáticas e africanas contra a dívida e o ajuste estrutural e todos os processos de mudança que se constroem na América Latina.

Convocamos igualmente a um dia de ação global contra o capitalismo: o 12 de outubro, onde, de todas as maneiras possíveis, rechaçaremos este sistema que destrói tudo por onde passa.


Movimentos sociais de todo o mundo, avancemos até a unidade a nível mundial para derrotar o sistema capitalista!
Venceremos!"

Oriente Médio: nada será como antes


O novo quadro no Oriente Médio


  Emir Sader, no seu blog

Por duas fortes razões o Oriente Médio tornou-se um pilar da política externa do império norteamericano: a necessidade estratégica do abastecimento de petróleo seguro e barato para os EUA, a Europa e o Japão, e a proteção a Israel ? aliado fundamental dos EUA na região, cercado por países árabes. 
Por isso o surgimento do nacionalismo árabe tornou-se um dos fantasmas mais assustadores para os EUA no mundo. Por um lado, pela nacionalização do petróleo pelos governos nacionalistas, afetando diretamente os interesses das gigantes do petróleo ? norteamericanas ou europeias ?, pela ideologia nacionalista e antimperialista que propagam ? de que o egípcio Gamal Abder Nasser foi o principal expoente ? e pela reivindicação da questão palestina.

A história contemporânea do Médio Oriente tem assim na guerra árabe-israelense de 1967 sua referência mais importante. A união dos governos árabes permitiu a retomada da reivindicação do direito ao Estado Palestino, que foi respondida por Israel com a invasão de novos territórios ? inclusive do Egito -, com o apoio militar direto dos EUA. 
Novo conflito se deu em 1973, agora acompanhado da política da OPEP de elevação dos preços do petróleo. A partir daquele momento ou o Ocidente buscava superar sua dependência do petróleo ou trataria de dividir o mundo árabe. Triunfou esta segunda possibilidade, com a guerra Iraque-Irã, incentivada e armada pelos EUA, que golpeou dois países com governos nacionalistas, que se neutralizaram mutuamente, em um enfrentamento sangrento. Como subproduto da guerra, o Iraque se sentiu autorizado a invadir o Kuwait ? com anuência tácita dos EUA -, o que foi tomado como pretexto para a invasão do Iraque e o assentamento definitivo de tropas norte-americanas no centro mesmo da região mais rica em petróleo no mundo.

Os EUA conseguiram dividir o mundo árabe tendo, por um lado os regimes mais reacionários ? encabeçados pelas monarquias, a começar pela Arabia Saudita, detentora da maior reserva de petróleo do mundo, e por outro governos moderados, como o Egito e a Jordânia. A maior conquista norteamericana foi a cooptação de Anuar el Sadar, o sucessor de Nasser, que supreendentemente normalizou relações com Israel ? o primeiro regime da região a fazê-lo -, abrindo caminho para a criação de um bloco moderado, pró-norteamericano na região, que se caracteriza pela retomada de relações com Israel ? portanto o reconhecimento do Estado de Israel ? e praticamente o abandono da questão palestina. Passaram a atuar também dento da OPEP, como força moderadora, favorável aos interesses das potências ocidentais 
O Egito, como país de maior população da região, com grande produção de petróleo e país daquele que havia sido o maior líder nacionalista de toda a região ? Nasser ? passou a ser o peão fundamental no plano político dos EUA na região. Não por acaso o Egito tornou-se o segundo país em auxilio militar dos EUA no mundo, depois de Israel e à frente da Colômbia.

Essa neutralização do mundo árabe, pela cooptação de governos e pela presença militar dos EUA no coração da região ? atualizada com a invasão do Iraque ? constituiu-se em elemento essencial da politica norteamericana no mundo e da garantia de abastecimento de petróleo para complementar a declinante produção dos EUA e todo o petróleo para abastecer a Europa e o Japão. 
É isso que está em jogo agora, depois da queda das ditaduras na Tunísia e no Egito. Impotente para agir de forma direta no plano militar, os EUA tentam articular transições que mudem a forma de dominação, mas mantenham sua essência. O Exército preferiu a renúncia de Mubarak, porque se deu conta que sua presença unia a oposição. Tem esperança que, sem ele, possa cooptar setores opositores para uma coalização moderada ? com El Baradei, a Irmandade Mulçumana, com o apoio dos EUA e da Europa ? que possa fazer reformas constitucionais, mas controlar o processo sucessório nas eleições de setembro, conseguindo desmobilizar o movimento popular antes que este consigar forjar novas lideranças.

Indepentemente de que possa se estender a outros países da região ? de que a Argélia, a Jordânia, o Marrocos, a Arábia Saudita, são candidatos fortes ? a queda das ditaduras na Tunísia e no Egito demonstra que os EUA já não poderão manter o esquema de poder montado há mais de três décadas. O menos que se pode esperar é a instabilidade política na região, até que outras coalizões de poder possam se organizar, cujo caráter dará a tônica do novo período em que entra o Oriente Médio.