Desta vez, sem retorno. Foi o que ela disse
naquela madrugada quando entrou na Preta ao lado do filho que estava no lugar
do motorista. Atrás, na carroceria, com a capota fechada, seus fidelíssimos Bia
e Bei.
O sem
retorno foi dito na despedida de suas amigas Dai e Bel. A madrugada deve
ter sido escolhida para o escuro da ainda noite esconder a fuga, as lágrimas
contidas que iam e as amigas árvores que ficavam guardando o lugar que foi a
sua Chácara Xury, o seu lugar.
Isto aconteceu há 10 meses, o tempo que Dona Pandá
precisou para falar sobre sua mudança. Diz que “a razão tem razões que o
coração desconhece” e este desconhecimento o deixa apalermado, preguiçoso.
Bia acompanhando o coração da dona, olhava sem
ver, não queria entrar na caminhonete. Bei entrou e rosnou até com o amigo,
exigindo um tempo. Nas horas dos 600 quilômetros, a presença forte e cuidadosa
do filhão e a atenção exigida pelos cachorros amenizaram a viagem dolorosa.
A chegada na nova casa, a Morada 21 de maio, foi
para Dona Pandá um turbilhão de emoções contraditórias. De um lado, a dor de um
estado de sofrimento por uma perda do tamanho do seu mundo, de outro, o acolhimento
carinhoso, cuidadoso de Iriem, a irmã sábia. Ainda bem que Bia e Bei demandaram atenção
especial para a entrada em seu novo lar. Como sempre, eles conseguiram mudar o
assunto da perda para as novidades do desconhecido.
A Morada 21 de maio foi construída no fundo do
sítio Catita, de propriedade da mana sábia. Os detalhes da casa e do canil foram
cuidadosamente planejados para que o acolhimento fosse perfeito.
Tudo foi muito bem preparado. Iriem só não
conseguiu dar à casa e sua área de influência o jeito de Dona Pandá que é
rústica, uma gambiagem, enquanto a mana é sofisticada, de fino acabamento.
Durante um bocado de tempo, ao planejar o mobiliário, Dona Pandá procurava
fazer com que o que fosse colocado dentro combinasse com a construção. Foi um
fracasso total. Quem, hoje, entra na Morada 21, pode até perceber o esforço do desengonçado
querer colocar uma gravata de seda e, no entanto, no lugar aparece um pano
xadrez desfiado.
Um vírus invadiu Dona Pandá e fez um baita
estrago. Foi no dia seguinte à visita do filho. Sem entender, não conseguiu se
levantar e durante 20 dias a cama foi seu lugar. Quando conseguiu, foi colocar
as mãos na terra, onde pegou sua boa energia e, com os cuidados da mana sábia,
começou a recuperação, bem mais lenta que esperada. A prescrição da sua Bruxa - a médica homeopática Regina – completou o
processo. Dona Pandá se voltou, então, às suas atividades curativas da alma.
Tratou de fazer uma horta e recuperar o pomar.
Agora, as dificuldades estão no seu campo de
conhecimento. Delimitar o pedaço para cercar a horta, preparar a terra. Ai, ai,
ai, que solo pobre! Precisamos de húmus, muito húmus! Onde encontrar esterco e
minhocas?! Enquanto não acha o fornecedor, o jeito é comprar o húmus que parece
feito de ouro! Caríssimo! Passa por muitos numa cadeia infinita para chegar ao
Catita. Mais uma vez, a estória se repete: o produtor mal consegue pagar seus
custos e o consumidor se dependa!
Dona Pandá inicia nova fase. Ela prometa contar
todo o caminho da alface que chega à mesa do Catita. Este foi o capítulo da
chegada às Alterosas. O próximo será o início da transa com a terra, o grande
desafio!