Ilda e Ramon - Sussurros de Liberdade

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quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

O plantador de árvores


Ele plantava árvores e me dizia:
 - Para de plantar árvores senão a chácara vai ficar sem Sol.
Cada vez que eu ia vê-lo em Belo Horizonte, ele havia feito algumas mudas de frutíferas que embalava de forma sempre muito criativa para que não sofressem com a viagem dos 600 km. Na última vez, quando lhe telefonei falando da minha ida de avião, senti um quezinho de irritação em sua voz ao me perguntar:
 - Você não vem com a Preta (caminhonete)?

 Descobri, logo que lá cheguei, o porquê do tom: as mudinhas estavam esperando uma carona para o seu destino: a Chácara Xury. Quando de minha despedida, ele não se deu o trabalho de discutir, embalou apenas três e não as seis que preparara e como recusar o presente? Era mais fácil deixar a mala.

No começo dos tempos da Chácara Xury, ele, acompanhado de sua companheira, vinha ajudar a transformar o terreno cheio de mato em  pomar, horta e jardim. Falava da falta de Sol e, dominado pela sina de plantador, de cada fruta que comia nascia uma árvore. Colhia as sementes, preparava as mudas, carregava-as das Gerais, nos ônibus, até seu destino, cavava a terra, plantava as mudinhas e lhes passava a energia da vida. Plantou manga, jabuticaba, lichia, cabeludinha, abacate, laranja, uvaia e ainda muitas outras.

Ele se foi. Deixou, em cada pedaço da Chácara, sua energia. Ando por aí e ele comigo. Durante muito tempo, depois de um passeio pelo pomar, vinha para o telefone querendo sua orientação  para algum problema e sofria um soco no coração ao perceber que não podia mais lhe telefonar.

 Eu ficara órfã.

Agora, não mais me engano, não mais pego o telefone, não preciso. Minha conversa é direta. Andamos juntos pela chácara. Examinamos juntos cada planta. Sentimos a alegria do despertar de cada flor. Sofremos juntos ao ver a jabuticabeira adoecer e se definhar sem aceitar o socorro que tentamos lhe dar.

Hoje, a alegria veio grande. Ao passar pela lichia – ele a plantou, trazendo a semente do sítio Catita, há mais de 10 anos – vi as primeiras frutas, lá bem no alto. Poucas, mas lindas no seu colorido, deliciosas no seu sabor delicado. Colhi cada lichia sentindo a presença dele como se sua mão me entregasse a fruta. 


Vim para a casa, me sentei na varanda olhando para a matinha lá mais distante, para o jardim bem perto e comecei a chupar as lichias. Sua energia encosta em mim quando as saboreio. Faço de conta que ele também se delicia com as frutas que plantou para mim. Minhas lágrimas são de saudade e da certeza de ter sido uma filha muito amada por um pai que foi plantador de árvore e de vida.