Na noite do dia
29, faltando, portanto, dois dias para a passagem do ano, houve, aqui, na
Chácara Xury, uma tempestade, com trovoadas e relâmpagos. Os apavorados Bei,
Bia e Pretinho conseguiram permissão para entrar na casa. Antes que derrubassem
a porta, Dona Pandá preferiu abrir mão da norma que proíbe cachorro ultrapassar
o umbral da porta. A energia elétrica acabou e todos os aparelhos elétricos e
eletrônicos foram rapidamente desligados, as lâmpadas de emergência salvaram
esses moradores da escuridão e os acalmaram um bocadinho.
No domingo, pela manhã, nada de energia. Como
o telefone é uma linha WLL, cuja estação transmissora depende da eletricidade e
o celular não tem sinal, a Chácara estava isolada, provocando em Dona Pandá uma
sensação de desconforto. Resolveu verificar se as chácaras vizinhas estavam na
mesma situação e descobriu que o problema era só dela. Foi até o padrão da
força, na entrada da chácara, e verificou que a energia chegava ao relógio.
Ficando claro sua total impotência, procurou, na estrada, um ponto mais alto
para conseguir o sinal do celular e pediu socorro a seu amigo faz de tudo, Divino, que, em 40 minutos,
estava, com um aparelhinho de teste buscando a fonte do problema.
A primeira
descoberta do Divino foi que toda a fase de voltagem 110v não funcionava e a de
220v, sim. A segunda foi que na cozinha havia um fio derretido e este estava
posicionado ao final de uma linha. Considerando um bom progresso na sua
pesquisa, Divino anunciou:
- Aqui está um
resultado do curto circuito. Agora, preciso achar onde foi o curto. Já vi isto
acontecer e o eletricista formado demorou um dia inteiro para achar o problema.
– Dona Pandá, respirando mais profundamente que seu normal e já abaixando a voz
(não sabia que ao final do dia estaria sibilando):
- Divino, vou perder
toda a comida que está no freezer e nas geladeiras!!!
- Olha, não perca a
calma, vamos descobrir. Vamos ver lá na casinha do Vanderlei como estão as
coisas por lá.
Embora Vanderlei não
more na Chácara Xury, o lugar onde ele
toma as refeições, descansa e também guarda as ferramentas que exigem mais
cuidados é chamado a Casinha do Vanderlei.
Verificaram que as coisas por lá estavam
como as coisas por cá. Divino, na
intenção de acalmar sua amiga, fez uma dissertação sobre as dificuldades da
eletricidade e Dona Pandá, por mais cuidado que tivesse com a sensibilidade do D. faz tudo, o interrompeu novamente com
a repetição de - “Vou perder toda a comida ...”
Dai, a nora de Dona
Pandá, havia avisado que seus pais viriam à CXury, no dia 31. Foram, então,
convidados participar do último almoço do ano. Eis a preocupação de nossa amiga
que já havia abastecido o freezer e a geladeira com os tira-gostos e as comidas
semipreparadas para essas festas. Na geladeira da Casinha, havia o peru
esperando o dia 31 para ir ao forno. Enquanto Divino apresentava seus
relatórios de pesquisa, Dona Pandá só conseguia pensar que não iria conseguir
fazer tudo de novo. Como amassar novamente as berinjelas? E o frango desossado? As cervejas? Os vinhos espumantes? Ai, ai, ai
não se passa de um ano para outro sem geladeira... Lá estava Divino falando... Ela
sabia que a intenção era acalmá-la, mas a cada minuto que passava, a impressão
de que iria perder a compostura ia ficando cada vez mais forte.
Divino precisava
subir numa escada para verificar os disjuntores. A escada é de ferro e ele
calçou uma chinela com sola de borracha para se proteger, mas houve uma pequena
incompatibilidade entre o tamanho da chinela e o dos pés dele, então Dona
Pandá, lembrando-se de seu avô, disse:
- Tudo bem, calcanhar não é pé. -
Divino subiu e Dona
Pandá ficou segurando a escada. De repente, ela viu um pé se levantar
estranhamente, num ângulo de 90 graus à esquerda, e a perna acompanhar levando todo o corpo que não passou do chão,
embora parecesse trêmulo e com o rosto embranquecido pelo choque levado. O susto foi maior que a dor, segundo o
acidentado que tudo fez para minimizar a vergonha passada. Dona Pandá se sentiu
culpada e preocupada com as consequências do choque e do tombo, mas o rapaz só se
desculpava. Aí falou mais alto o autoritarismo da dama que o fez se movimentar
observando cuidadosamente até se convencer de que de fato nada grave havia
acontecido. Deixada a escada de lado, voltaram à casa principal e recomeçaram a
pesquisa.
Às 14h, depois de
uma batalha com a escada, agora de madeira, para verificar os fios nos postes altos, Dona Pandá foi
novamente em busca de um ponto de sinal para o celular e pediu socorro para o
Vanderlei. Chegando, ele substituiu Dona Panda no segurar a escada e mais uma
hora se passou sem que se descobrisse algo que desse a luz. A ideia, então, foi o Vanderlei buscar seu
sogro Hélio, o eletricista que havia feito a instalação elétrica da CXury. O
pequeno problema é que Hélio estava, em consequência de um acidente, de
muletas.
O eletricista chegou
junto com a chuva. Os três corajosos rapazes, sem tomar conhecimento da água
que caia, foram vistoriar toda a rede interna à Chácara. Hélio, no chão, encostado
em alguma árvore comandava, enquanto os outros dois – um no chão segurando a
escada e o outro sobre ela – executavam as ordens de pega o fio azul, testa com o fio branco... Num determinado
momento, com a chuva mais forte, Dona Pandá falou que estava desistindo e no
outro dia veria o que fazer, pois além da chuva, do cansaço, o dia já
desaparecera há algum tempo. Os intrépidos cavalheiros comunicaram que só iriam
embora depois de deixar as geladeiras funcionando.
Eram 20h quando
descobriram o ponto do curto que, evidentemente, estava nos últimos metros de
fio vistoriado. Fomos, então, testar. Todas as lâmpadas e tomadas queimadas, assim
como o forno micro-ondas, o rádio-relógio, filtros de linha e outras cositas más. Quando Dona Pandá
abriu o freezer, nem acreditou... estava tudo congelado ainda, após 24h! Dona
Pandá estava salva!