Ilda e Ramon - Sussurros de Liberdade

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domingo, 10 de maio de 2020

Lugares para a felicidade



                                                               Ao André, meu filho único em tantos sentidos.

A quarentena em si, o ficar em casa, não tem me afetado muito. O que vem com ela, sim, suas causas e consequências são tétricas. A ideia do tolhimento do ir e vir, da nossa liberdade, como povo e como indivíduo, é suficiente para incomodar. Preciso me concentrar no motivo para me acalmar e respeitar o isolamento. Assim, acredito que as pessoas que não o respeitam o fazem por não ter a consciência do seu significado. São ignorantes da história recente do Planeta. Não sabem o que e como o vírus Covid-19 fez com os humanos da China, da Itália, por exemplo, pois estou falando do mundo. Se pudessem – se seu conhecimento permitisse -  comparar os efeitos do vírus e o comportamento dos governantes, consequentemente, da população de países como EUA com Vietnã, não sairiam de casa.

Abro parêntesis: (No Brasil, a grande exceção mundial, o presidente é cruel “a quem apraz derramar sangue, causar dor; cruento que gosta de fazer o mal, atormentar, maltratar; impiedoso, duro, implacável, intransigente; insensível. (Definição segundo Dicionário Eletrônico Houaiss) Os 30% de brasileiros que o seguem são seus semelhantes, embora não disponham das informações que um chefe de país tem. Esta crueldade é compatível com interesses espúrios, havendo, inclusive, o aproveitamento da situação - horrenda para o povo -, visando alcançar alguns objetivos.) Fecho parêntesis.

Concentrando-me, então, nos dados relativos aos EUA e comparando-os aos do Vietnã, procuro amenizar minha perda temporária de liberdade. Como ela é, já disse Fernando Sabino, o espaço da felicidade e disto, tenho, em todo meu ser, certeza, a dificuldade aumenta exponencialmente. Não deixa de ser um desafio. A primeira ideia que me vem é chamar Dona Pandá.

Ela chega com Bethânia: -Quem me chamou? Eu estou aqui, o que que há?  Então você está à caça da felicidade?
- Nem tanto – respondo – quero amenizar a prisão domiciliar.
- Assim não vai dar. Chamando este lugar lindo, com verde pra todo canto, desse nome feio, não ajuda amenizar nadinha. Quer saber? A felicidade, precisa de outras coisas além da liberdade.
- Ah! Então a senhora concorda...
- Eu não sou tão doida a ponto de discordar do mineiro. Você é meio ignorante em literatura, mas mesmo assim sabe que Sabino era mineiro, não é?
- Não precisa ofender!
- É, fui grosseira. Vamos retornar ao assunto.  
- De que outras coisas a felicidade precisa?
- Não é propriamente precisar. Há coisas que são caminhos para...Acabo de me lembrar de um atalho garantido, o amor. Se alguém se apaixona por outrem, a felicidade não escapa. Há até a expressão muita usada, aqui, pelas Alterosas: Feliz que nem bobo quase sempre se refere a alguém apaixonado. Qualquer amor traz felicidade, pode trazer outras coisas, mas o amor correspondido é tiro certo.

- Esse atalho, no isolamento, ou já existe ou fica para procurar depois desta quarentena. Pode rir, mas sem ser atalho, pode dar outros caminhos? Aposto que não conhece.

- Deixa de falar bobagem, menina. Vamos lá. Vou listar algumas coisas que sei em relação a você, não são muitas, já que você, como todos jovens, muda de gosto. Não precisa fazer esta cara. Este mudar de gosto é saudável, significa crescimento. Você tem um gosto musical, hoje, mais requintado do que há alguns anos.

- Dona Pandá, me desculpe a ousadia, mas a senhora está, de novo, saindo do assunto.

- Agora você me lembrou uma criança adorável que falava “de ovo”. Está bem vamos retornar de novo. Continuando no musical, que, neste seu caso, é um exemplo perfeito: escutar a boa música é um bom caminho. Compor, para você, ouso dizer que é outro atalho garantido. Criar é uma atividade exigente, solitária e egoísta. Exige toda sua alma, não aceita pedaços. Se você está menos que inteiramente, a criação sai medíocre, não satisfaz. Aí é bobagem, não é caminho.

- Estamos falando de composição, de música?

- E de você. Se estivéssemos falando do meu amigo Roberto, o caminho seria literatura. Certo? Então, o atalho seguro, aqui, é a criação de música, da boa música.

- Se não “sair” a boa música?

- Você fará a boa música se se entregar a ela. A exigência dela é total, ela quer sua alma. Em dando o que ela exige, só sai a boa música. O parâmetro do que é bom é a satisfação do criador.  É claro que estamos falando de você que tem a arte na alma. É por isto que precisa doá-la sem regatear.

A criação é solitária. É claro que há criações coletivas, mas estamos no isolamento. Sua inspiração se relaciona com sua vida passada, presente ou desejada, com seus sentimentos, com tudo onde consegue chegar, mas ninguém anda por você. A captação é de sua capacidade. Não vivemos isolados, ao contrário vivemos cercados de um mundo interno e externo que percebemos e que levamos para nossa criação. Ainda assim, no ato de criar, estamos sós, com tudo que é nossa captação, com toda nossa vida.

A criação é egoísta.  Não aceita preguiça ou distração. Nada que a divida, que a restrinja.
Esta falação toda é para lhe mostrar que estando no ato de criar, você não sente a falta da liberdade. A arte é libertária.

- Dona Pandá, e os caminhos? A senhora falou de dois atalhos seguros.

- Você pode, nos intervalos do amor e da música, buscar outros prazeres, como por exemplo, mexer com a terra, plantar. Dispor da terra já é um caminho dado. É uma boa hora de planejar uma horta, um pomar. Cuidar dos bichinhos. Na realidade, são atividades de que você gosta e que já realiza.  Acho que o fundamental é manter a cabeça longe da restrição de não poder ir e vir.  O segredo da vida é buscar ser feliz, inventar lugares para a felicidade e estar lá.