Ilda e Ramon - Sussurros de Liberdade

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quinta-feira, 27 de outubro de 2011

DO CAPITAL AO SOCIAL

Frei Betto

     O economista Raul Velloso, especialista em contas  públicas, calcula que, em 2010, através de programas sociais, o governo  federal repassou a 31,8 milhões de brasileiros - a maioria, pobres - R$ 114  bilhões. Ao incluir programas de transferência de renda de menor escala, o  montante chega a R$ 116 bilhões.
     Este valor é mais que o dobro de todo o investimento  feito pelo governo no mesmo ano - R$ 44,6 bilhões, incluindo construção de  estradas e obras de infraestrutura.
     Os R$ 116 bilhões foram destinados à rede de proteção  social, que abarca aposentadoria rural, seguro-desemprego, Bolsa Família,  abono salarial, Renda Mensal Vitalícia (RMV) e Benefício de Prestação  Continuada (BPC). Esses programas abocanharam 3,1% do  PIB.
      A RMV, criada em 1974, era um benefício  previdenciário destinado a maiores de 70 anos ou inválidos, definitivamente  incapacitados para o trabalho, que não exerciam atividades remuneradas, nem  obtinham rendimento superior a 60% do valor do salário mínimo. Também não  poderiam ser mantidos por pessoas de quem dependiam, nem dispunham de outro  meio de prover o próprio sustento.
      Em janeiro de  1996, a RMV foi extinta ao entrar em vigor a concessão do BPC. Hoje, a RMV é  mantida apenas para quem já era beneficiário até 96. Já o BPC é pago a idosos  e portadores de deficiências comprovadamente desprovidos de recursos  mínimos.
     
Há quem opine  que o governo federal “gasta” demais com programas sociais, prejudicando o  investimento. Ora, como afirma Lula, quando o governo canaliza recursos para  empresas e bancos, isso é considerado “investimento”; quando destina aos  pobres, é “gasto”...
     O Brasil, por muitas décadas, foi considerado campeão  mundial de desigualdade social. Hoje, graças à rede de proteção social, o  desenho da pirâmide (ricos na ponta estreita e pobres na ampla base) deu lugar  ao losango (cintura proeminente graças à redução do número de ricos e  miseráveis, e aumento da classe média).
     Segundo o Ipea, entre 2003 e 2009, 28 milhões de  brasileiros deixaram a miséria. Resultado do aumento anual do salário mínimo e  da redução do desemprego, somados ao Bolsa Família, às aposentadorias e ao  BPC.
     A lógica capitalista considera  investimento o que multiplica o lucro da iniciativa privada, e não o que  qualifica o capital humano. Essa lógica gera, em nosso mercado de trabalho, a  disparidade entre oferta de empregos e mão de obra qualificada. Devido à baixa  qualidade de nossa educação, hoje o Brasil importa profissionais para funções  especializadas.
     Se o nosso país resiste à crise financeira que, desde  2008, penaliza o hemisfério Norte, isso se deve ao fato de haver mais dinheiro  em circulação. Aqueceu-se o mercado interno.
     Há queixa de que os nossos aeroportos estão  superlotados, com filas intermináveis. É verdade. Se o queixoso mudasse o  foco, reconheceria que nossa população dispõe, hoje, de mais recursos para  utilizar transporte aéreo, o que até pouco tempo era privilégio da  elite.
     Há, contudo, 16,2 milhões de brasileiros  ainda na miséria. O que representa enorme desafio para o governo Dilma. Minha  esperança é que o programa “Brasil sem miséria” venha resgatar propostas do  Fome Zero abandonadas com o advento do Bolsa Família, como a reforma  agrária.
      Não basta promover distribuição de renda  e facilitar o consumo dos mais pobres. É preciso erradicar as causas da  pobreza, e isso significa mexer nas estruturas arcaicas que ainda perduram em  nosso país, como a fundiária, a política, a tributária, e os sistema de  educação e saúde.

Frei Betto é escritor, autor de “Sinfonia Universal –  a cosmovisão de Teilhard de Chardin” (Vozes), entre outros  livros. http://www.freibetto.org/>    twitter:@freibetto.
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